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PALAVRAÇÃO: Conhecer, praticar, ensinar os Evangelhos

Por Paulo Freire

Trazemos aqui o testemunho de Paulo Freire, em algumas notas  que ele escreve a 4 jovens seminaristas alemães, em Genebra, 1977, e publicada em 1982, na revista Tempo e Presença. Com este mestre da pedagogia, falecido em 1997, queremos compartilhar nossos objetivos.

Conhecer, praticar, ensinar os Evangelhos

            Costumo dizer que, independentemente da posição cristã em que sempre procurei estar, Cristo seria, como é, para mim um exemplo de Pedagogo.

            Na minha infância longínqua, nas aulas de catecismo, em que um saudoso, mas ingênuo, sacerdote falava da danação das almas perdidas para sempre no fogo de um inferno eterno, não obstante o medo que me tomava, o que ficava realmente em mim era a bondade grande, a valentia de amar, sem limites, que o Cristo nos testemunhava.

            Menino ainda, jovem depois, homem afinal, em quem, contudo, o menino continuou vivo, me fascinava e me fascina, nos Evangelhos, a indivisibilidade entre seu conteúdo e o método com que o Cristo os comunicava. O ensino do Cristo não era nem poderia ser o de quem, como muitos de nós, julgando-se possuidor de uma verdade, buscava impô-la ou simplesmente transferi-la. Verdade Ele mesmo, Verbo que se fez carne, História viva, sua pedagogia era a do testemunho de uma Presença que contradizia, que denunciava e anunciava. Verbo encarnado. Verdade Ele mesmo, a palavra que dEle emanava não poderia ser uma palavra que, dita, dela se dissesse que foi, mas uma palavra que sempre estaria sendo. Esta palavra jamais poderia ser aprendida se não fosse apreendida e não seria apreendida se não fosse igualmente por nós encarnada. Daí o convite que o Cristo nos fez e porque nos fez continua a nos fazer - o de conhecer a verdade de Sua mensagem na prática de seus mínimos pormenores.

            Sua palavra não é som que voa: é PALAVRAÇÃO.

            Não posso conhecer os Evangelhos se os torno como palavras que puramente "aterrissam" em meu ser ou se, considerando-me um espaço vazio, pretendo enchê-lo com elas. Esta seria a melhor maneira de burocratizar a Palavra, de esvaziá-la, de negá-la, de roubar-lhe o dinamismo do eterno estar sendo para transformá-la na expressão de um rito formal. Pelo contrário, conheço os Evangelhos, bem ou mal, na medida em que, bem ou mal, os vivo. Experimento-os e neles me experimento na  prática social de que participo historicamente, com os seres humanos. Daí a aventura arriscada que é aprendê-los e ensiná-los, enquanto um ato indicotomizável; daí o medo quase sempre incontido que nos assalta ao escutar o chamamento do Cristo à prática de Sua mensagem; daí as racionalizações intelectualistas em que caímos e com que opacisamos a Transparência; daí que falamos tanto de BOA NOVA, sem a denúncia do mau contexto que obstaculiza a efetivação da BOA NOVA; daí que separamos Salvação de Libertação; dai, finalmente, que nos "arquivamos" num tradicionalismo ou num modernismo - maneira de sermos mais eficientemente tradicionais - alienadores, recusando o estar sendo para poder ser o que caracteriza a verdadeira posição profética.

            Conhecer os Evangelhos enquanto busco praticá-los, nos limites que a minha própria finitude me impõe é, assim, a melhor forma que tenho para ensiná-los. Neste sentido é que somente a prática de quem se sabe humildemente um eterno aprendiz, um educando permanente da Palavra, lhe confere autoridade, no ato de aprendê-la e de ensiná-la.

            Autoridade, por isto mesmo, que jamais se alonga em autoritarismo.

            Este, pelo contrário, é sempre a expressão da redução da Palavra a mero som - não mais PALAVRAÇÃO - e a negação, portanto, do testemunho pedagógico do Cristo.   

TExto enviado por Celso Pinto Carias                                                                 

 

 

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