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Encontro no Dicastério para o Desenvolvimento Humano Integral leva a Roma a voz dos Yanomami, das periferias

Por Por Luis Miguel Modino

A canonização de São José Allamano, fundador dos Missionários e das Missionárias da Consolata, juntamente com a celebração da Segunda Sessão da Assembleia Sinodal do Sínodo sobre a Sinodalidade, tornou possível que a voz da Amazônia e de seus povos, a voz das periferias, estivesse presente em várias instituições italianas e vaticanas.

O apoio do Papa aos Yanomami

Uma dessas reuniões aconteceu no Dicastério para o Desenvolvimento Humano Integral, onde a voz da Terra Indígena Yanomami foi levada por um de seus líderes, Julio Ye”kwana. Foi nesse território, na Missão Catrimani, onde os Missionários e as Missionárias da Consolata estão presentes desde 1965, que aconteceu o milagre que levou a Igreja Católica a reconhecer a santidade de São José Allamano em 20 de outubro de 2024, Dia Mundial das Missões.

No final das canonizações, o Papa Francisco disse: “O testemunho de São José Allamano nos lembra da necessidade de cuidar das populações mais frágeis e vulneráveis. Penso em particular no povo Yanomami da floresta amazônica brasileira, entre cujos membros ocorreu o milagre ligado à canonização de hoje. Faço um apelo às autoridades políticas e civis para que garantam a proteção desses povos e de seus direitos fundamentais e contra qualquer forma de exploração de sua dignidade e de seus territórios”. Tornar conhecido o sofrimento desses e de outros povos, dentro e fora do Brasil, é o caminho para que sua dignidade seja reconhecida e respeitada.

Grave crise na Terra Indígena Yanomami

Os Yanomami vêm sofrendo, especialmente desde 2019, com a precariedade de suas condições de vida, o que levou à morte por causas evitáveis de mais de 500 crianças com menos de 4 anos de idade. Tudo isso é consequência do garimpo ilegal, que desmatou a floresta, poluiu os rios com mercúrio, aumentou as doenças e levou a fome ao território, o que foi confirmado de várias maneiras. Situações que levaram o Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral a apoiar e acompanhar os povos indígenas na defesa de sua cultura, língua e saúde, algo em que sempre contaram com o apoio do Santo Padre.

O Dicastério para o Desenvolvimento Humano Integral está empenhado em levar a Roma a voz dos povos indígenas, dos migrantes, das periferias. Eles estão presentes nos territórios para escutar os clamores do povo, algo que consideram um presente e um processo a ser continuado. Não se pode ignorar que a Igreja Católica tem uma forte influência na defesa dos direitos humanos em nível internacional. Isso é fortalecido quando esse trabalho é realizado em uma rede, em conjunto, por meio de alianças entre territórios e bispos, de forma sinodal. Por essa razão, o dicastério se oferece aos territórios como uma presença no território para influenciar, discernir e servir.

Realidade da Terra Indígena Yanomami

Os participantes da reunião ouviram de Julio Ye”kwana a realidade da Terra Indígena Yanomami, demarcada em 1992, onde vivem 33.000 indígenas em 350 comunidades. É um território que atravessa as fronteiras entre Brasil e Venezuela, pois para os indígenas não há fronteiras. A situação é dramática devido ao garimpo ilegal, que tem ferido a terra e os povos indígenas, que estão sendo constantemente corrompidos. Soma-se a isso o fato de que, no Brasil, os povos indígenas sofrem com a ameaça do Marco Temporal, claramente inconstitucional, que os mobilizou em uma luta contra.

O Pe. Corrado Dalmonego, missionário e antropólogo da Consolata, que viveu por muitos anos entre os Yanomami na Missão Catrimani tem realizado um trabalho de pesquisa e desenvolvimento. Ele reconhece a redução da presença de garimpeiros e vê a necessidade de reativar as bases da proteção etno-ambiental. Denuncia também que a mortalidade infantil e a desnutrição, embora reduzidas, continuam, pois falta capilaridade e regularidade nos serviços de saúde. Ressalta ainda que, uma vez que a terra e os rios estejam contaminados pelo mercúrio, não será possível retornar ao território, pois a população sofrerá problemas neurológicos. O missionário entregou material sobre os Yanomami aos membros do Dicastério, solicitando que encontrassem canais para rastrear o ouro que sai da Terra Yanomami para vários países.

O trabalho do CIMI

Diante da situação dos povos indígenas, a Igreja no Brasil criou o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), como lembrou o arcebispo de Porto Velho e ex-presidente do CIMI, Dom Roque Paloschi. Dessa forma, ele destacou o trabalho de Dom Erwin Kräutler e de Dom Luciano Mendes de Almeida para que a Constituição Brasileira de 1988 reconhecesse os direitos indígenas. Da mesma forma, o Relatório de Violência contra os Povos Indígenas que o CIMI produz todos os anos.  O bispo, que já pastoreou a Igreja de Roraima, definiu a Missão Catrimani como resultado do Concílio Vaticano.

Do Dicastério, seu prefeito, o cardeal Michael Czerny, insistiu que sua missão é “acompanhar e ajudar se necessário”, questionando como podem ajudar e pedindo que sejam mantidos informados sobre o trabalho que está sendo realizado na Amazônia e, assim, compartilhar essas boas práticas.

Os povos indígenas estão organizados

Nesse sentido, o Arcebispo de Manaus e Presidente do CIMI, Cardeal Leonardo Steiner, refletiu sobre a preocupação de todos os governos com sua imagem, algo que não aconteceu com o governo brasileiro anterior. Em seu discurso, ressaltou a importância das palavras do Papa no Angelus em apoio aos Yanomami, como algo importante para os povos indígenas, pois repercutem em todo o mundo.  O Cardeal Steiner agradeceu ao Dicastério por seu apoio e pediu apoio contínuo em termos de cultura, língua e saúde, enfatizando que “sempre contamos com o apoio do Santo Padre”. Ele também enfatizou que os povos indígenas estão bem organizados: com advogados, enfermeiros, criando consciência de seus direitos. Um grande desafio, porque “existe a possibilidade de que os povos desapareçam”, especialmente por causa do mercúrio.

A Ir. Sofia Quintans Bouzada agradeceu ao Dicastério por “levar a Roma a voz dos povos indígenas, dos migrantes, das periferias”, convidando seus membros a irem aos territórios, escutar os clamores e levar seus sentimentos a Roma.  Ela reafirmou as palavras sobre a influência da Igreja Católica em termos de direitos humanos em nível internacional e a necessidade de trabalhar em redes, de fazer alianças entre territórios e bispos. A religiosa enfatizou que “as mulheres arriscaram suas vidas para que o milagre de Allamano acontecesse, as mulheres rezaram”, e mostrou a disponibilidade do território para continuar nessa defesa, para discernir, para servir.



 

 

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