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30/03/2020 Antônio Carlos Santini   Edição 3922 A festa acabou...
F/ Pixabay
"eus se esconde nas pequenas esquinas de cada dia. É preciso abrir os olhos e percebê-lo, para não se lamentar "

 

Mês de março, hora de recomeçar. Até então, tivemos festas: árvores de Natal, foguetes de Ano Novo, desfiles de Carnaval. Mas toda festa chega ao fim e é hora de trabalhar. Afinal, não se vive só de festa.

Quando a festa acaba, a gente se pergunta: “E agora?” Podem conferir no verso de Drummond: o José não pode ficar inerte enquanto o mundo gira e a Lusitana roda desde 1921. Aliás, no próximo ano, a Lusitana vai celebrar a festa do seu centenário, mas não são 100 anos de festa – são 100 anos rodando Brasil afora, gastando pneus, enfrentando barro e os veneráveis buracos de nossas estradas (alguns deles também centenários). Exatamente por ser uma empresa dedicada a mudanças, a Lusitana não pode ficar parada.

Nada contra as festas. Elas reúnem as pessoas, quebram a rotina, ajudam a temperar a vida. Mas a vida não é uma festa. Perguntem aos três apóstolos que contemplaram, extasiados, a transfiguração de Jesus, se eles tiveram tempo de esticar as três tendas no alto do morro... Claro que não! Foi preciso descer o Tabor e enfrentar a realidade do dia a dia, incluindo a Paixão para Cristo e a negação para Simão Pedro.

O Tabor dura pouco, com sua explosão de luz. Carnaval também, com seus confetes coloridos, mas logo vem a Quarta-feira de Cinzas com o simbolismo do pó preto que recorda a efemeridade de nossos festejos. Você faz uma peregrinação a um famoso santuário e ali experimenta a presença de Deus. Finda a romaria, é hora de voltar para casa e conviver com o patrão que morde e com o cachorro que late no andar de cima. Você fez um retiro espiritual e sentiu-se cheio de Deus. Terminado o retiro, não há como fugir ao trânsito e às contas a pagar. Tanto a peregrinação quanto o retiro só têm sentido se ajudarem você a permanecer na presença de Deus entre cães que latem e buzinas que urram...

Minha intenção é lembrar a importância do cotidiano. E a necessidade de encontrar sentido nas coisas comuns, dar valor ao trivial, sacralizar as coisas banais. Não podemos desperdiçar o tempo que vai da terça-feira gorda até o próximo Natal. O relógio estará girando – tal como a Lusitana – e oferecendo a conta-gotas as oportunidades de imaginar, projetar, construir, partilhar a vida.

Nesta duração – ao menos enquanto duramos... – as pessoas cruzarão nossos caminhos entre sorrisos e lágrimas, solicitações e presentes, perguntas e respostas, tecendo ponto a ponto o bordado da vida. E o curioso é que não conhecemos o risco do bordado, que precisa ser inventado a cada dia. Nem sempre podemos escolher as cores, mas com um pouco de jeito e de amor, teremos no fim alguma obra realizada. Aqui e ali, espetamos o dedo, erramos o ponto, mas sempre se pode recomeçar.

E mais: Deus se esconde nas pequenas esquinas de cada dia. É preciso abrir os olhos e percebê-lo, para não se lamentar como Jacó ao acordar do sono: “Deus estava naquele lugar, e eu não sabia!” (Gn 28,16)

 

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