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02/03/2020 Antônio Carlos Santini   Edição 3921 A triste arte de sobrenadar
F/ ufunk
"Nós não somos bolinhas de pingue-pongue. Em nossa vida espiritual, para ir ao fundo é preciso esvaziar-se..."

 

Na Segunda Guerra mundial, um astuto almirante japonês “bolou” uma isca para caçar submarinos ianques: velhos cargueiros com os porões abarrotados de... bolas de pingue-pongue. O ávido submarino vinha à tona e lançava um ou dois torpedos. Ainda que acertassem o alvo, o cargueiro não afundava.

Na ânsia de levar a cabo a missão, os atacantes se demoravam na superfície para lançar novos torpedos, dando tempo aos destróieres japoneses de contra-atacar e atingir o submarino com bombas de profundidade.

Bolas de pingue-pongue, cheias de ar, não submergem. Foram feitas para a superfície. Nós não somos bolinhas de pingue-pongue. Em nossa vida espiritual, para ir ao fundo é preciso esvaziar-se... Pena que estejamos tão cheios de ar, tão ocupados!

Bem, para falar francamente, ocupados com ninharias e futilidades. São pequenos programas, encontros fugidios, tudo à flor da pele, como no “Sinal Fechado” de Chico Buarque. Nesse “clima” de superficialidades, nada chega ao fundo de mim... O próprio trabalho se transforma em mecânica repetição, sem alma e sem alegria, que apenas ocupa a epiderme de meu ser. Até o encontro de amor resvala na rotina, tecido de peles que se roçam, enquanto o verme da solidão continua a roer o âmago do ser.

Mesmo um ato sacramental (seja a confissão dos pecados, seja a comunhão eucarística...) pode ser vivido na periferia: mecânico, frio, marginal... Na Santa Missa, o excesso de ruído, música em volume excessivamente alto, agitação, procissões cheias de símbolos estranhos ao mistério eucarístico, tudo impede o mergulho interior. Ficamos boiando à flor das águas...

Bolas de pingue-pongue? Sim! Cheias de TV, novelas de lágrimas fingidas, dramas impostados, “desafios” previsíveis, sucessos fabricados. Você se deita, fecha os olhos na escuridão, e lá está o ruído. Ele pulsa. Lateja. Estende uma capa de cimento entre você e seu interior.

E lá dentro? Ora, lá dentro habita o Espírito de Deus. Tenta comunicar-se. Clama por sua atenção. Mas você não consegue ouvir, hipnotizado pela tragicomédia das horas que passam.

De vez em quando, alguém se liberta. Galvanizado pela graça, rompe com as modas e as normas. Quebra o contrato com o capital e a fama. Esvaziado e livre, salta do trampolim mais alto e vai ao fundo.

Ali, Deus o esperava. E o encontro se faz...

 

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