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30/09/2020 Papa Francisco Edição 3928 Amar o que Jerónimo amou
F/ Jean Louis Mazieres on Visualhunt
"Mensagem do Papa Francisco sobre as Escrituras Sagradas neste dia dedicado a São Jerônimo. Sobre o afeto à Sagrada Escritura 30/09/2020."

Amar o que Jerónimo amou

Ao concluir esta Carta, desejo fazer mais um apelo a todos. Entre muitos elogios feitos a São Jerónimo pelos seus vindouros, encontra-se este: não foi considerado simplesmente um dos maiores cultores da «biblioteca» de que se nutre o cristianismo ao longo dos tempos, a começar pelo tesouro da Sagrada Escritura, mas aplica-se-lhe aquilo que ele mesmo escreveu sobre Nepociano: «Com a leitura assídua e a meditação constante, fizera do seu coração uma biblioteca de Cristo».[58] Jerónimo não poupou esforços para enriquecer a sua biblioteca, vendo nela um laboratório indispensável para a compreensão da fé e para a vida espiritual; e, nisto, constitui um exemplo admirável também para o presente. Mas ele foi mais longe! O estudo não se limitou aos anos juvenis da formação, mas foi um compromisso constante, uma prioridade de cada dia da sua vida. Enfim, podemos dizer que ele assimilou uma biblioteca inteira e tornou-se dispensador de ciência para muitos outros. No século IV, Postumiano, que viajou pelo Oriente para descobrir movimentos monásticos, foi testemunha ocular do estilo de vida de Jerónimo, com quem viveu alguns meses, tendo-o descrito assim: «Encontra-se todo embrenhado na leitura, todo embrenhado nos livros; não descansa de dia nem de noite; sempre está a ler ou a escrever qualquer coisa».

A propósito, penso muitas vezes na experiência que pode fazer hoje um jovem quando entra numa livraria da sua cidade ou num site da Internet e procura lá o setor dos livros religiosos. Quando existe, na maioria dos casos trata-se de um setor que não só é marginal, mas carece de obras substanciosas. Examinando aquelas estantes ou as páginas em rede, dificilmente um jovem poderia compreender como a investigação religiosa seja uma aventura apaixonante que une pensamento e coração; como a sede de Deus tenha inflamado grandes mentes no decurso dos séculos até hoje; como o amadurecimento da vida espiritual tenha contagiado teólogos e filósofos, artistas e poetas, historiadores e cientistas. Um dos problemas atuais – e não só da religião – é o analfabetismo: faltam as habilitações hermenêuticas que nos tornem intérpretes e tradutores credíveis da nossa própria tradição cultural. De forma especial aos jovens, quero lançar um desafio: parti à procura da vossa herança. O cristianismo torna-vos herdeiros dum património cultural insuperável, do qual deveis tomar posse. Apaixonai-vos por esta história, que é vossa. Tende a ousadia de fixar o olhar naquele jovem inquieto que foi Jerónimo; ele, como a personagem da parábola de Jesus, vendeu tudo quanto possuía para comprar a «pérola de grande valor» (Mt 13, 46).

Verdadeiramente Jerónimo é a «Biblioteca de Cristo», uma biblioteca perene que, passados dezasseis séculos, continua a ensinar-nos o que significa o amor de Cristo, um amor inseparável do encontro com a sua Palavra. Por isso, o centenário atual constitui um apelo a amar o que Jerónimo amou, redescobrindo os seus escritos e deixando-se tocar pelo impacto duma espiritualidade que se pode descrever, no seu núcleo mais vital, como o desejo inquieto e apaixonado dum conhecimento maior do Deus da Revelação. Como podemos deixar de ouvir, em nossos dias, aquilo a que Jerónimo instigava sem cessar os seus contemporâneos: «Lede com 13 muita frequência as divinas Escrituras; aliás, que o Livro Sagrado nunca seja deposto das vossas mãos»?[60]

Exemplo luminoso é a Virgem Maria, evocada por Jerónimo sobretudo na sua maternidade virginal, mas também na sua atitude de leitora orante da Escritura. Maria meditava no seu coração (cf. Lc 2, 19.51) «porque era santa e lera a Sagrada Escritura, conhecia os profetas e lembrava-se do que o anjo Gabriel Lhe anunciara e fora vaticinado pelos profetas (...), via o recém-nascido que era seu filho, o seu único filho que jazia e chorava naquele presépio, mas verdadeiramente a quem Ela via ali deitado era o Filho de Deus. O que Ela via comparava-o com quanto lera e ouvira». Confiemo-nos a Ela, que pode, melhor do que ninguém, ensinar-nos como ler, meditar, rezar e contemplar a Deus que Se faz presente na nossa vida, sem nunca Se cansar.

Roma, em São João de Latrão, na Memória litúrgica de São Jerónimo, 30 de setembro do ano 2020, oitavo do meu pontificado.

Papa Francisco

Acesse o texto completo em português: Scripturae Sacrae Affectus

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