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25/06/2023 Luis Miguel Modino Edição 3960 As redes eclesiais da América Latina são esperança organizada Diz Emilce Cuda no encontro da Amerindia
F/ REPAM
"Necessário de ter em conta três elementos: a bússola, que é o Evangelho, que nos indica para onde ir, as ferramentas, que são as redes eclesiais, e a âncora, que é a esperança. [...] esta organização eclesial comunitária ajuda a concretizar uma reforma iniciada há 10 anos, que não é outra coisa senão a conversão, concluiu a teóloga."

De 22 a 25 de junho, Manaus acolhe o Encontro Continental da Ameríndia, que tem como tema: "Topos de Utopia em tempos de turbulência na Nossa América". 61 participantes de 13 países estão a refletir sobre a teologia da libertação e a opção pelos pobres, mas também querem conhecer a Igreja com rosto amazônico que o Sínodo para a Amazônia está a promover, algo assumido pela Equipe Itinerante, que há 25 anos percorre os rios e estradas da região.

Foram eles que animaram a mística inicial, que trouxe os participantes para uma realidade onde o grito da Terra e dos pobres está presente. É no meio destes gritos que a Igreja é chamada a estar presente, algo que a Ameríndia tem assumido ao longo da sua história, uma presença nas periferias, o lugar para onde o Papa Francisco chama a ir aqueles que se dizem discípulos e discípulas de Jesus.

Um motivo de orgulho para a Igreja na América Latina

Emilce Cuda refletiu sobre o atual pontificado, o primeiro de um Papa latino-americano, que completou recentemente 10 anos. A secretária da Pontifícia Comissão para a América Latina, ao analisar o pontificado do Papa Francisco, partiu da afirmação de que "é um orgulho para a Igreja na América Latina que um de nós esteja no coração da Igreja Católica, levando a nossa teologia, cultura e sonhos".

Ao analisar o atual Magistério Pontifício, a teóloga argentina recordou que este começa com a Evangelii Gaudium, "onde nos propõe uma Igreja em saída", vendo na Fratelli tutti o texto que nos propõe como o fazer. Por isso, insistiu em concentrar-se no caminho e não na busca das essências, porque isso não ajuda, mas fecha os processos. Emilce Cuda recordou que o Papa Francisco nos pede para iniciar processos, uma bem-aventurança que nos leva ao melhor, que tem a moção do Espírito Santo e o espírito do povo, uma bem-aventurança que não se constrói com essências e se define em caminhos, sublinhou.

A Evangelii Gaudium como ponto de partida

Recordando os quatro princípios da Evangelii Gaudium, onde diz que a realidade é superior à ideia, algo que explica na Querida Amazônia com os quatro sonhos, onde não fala de necessidades; o todo é superior à parte, o que se concretiza numa Igreja organizada em redes de comunidades; a unidade é superior ao conflito, algo que sabemos quando iniciamos processos em que todos procuramos a unidade para salvar o continente, ou nos unimos ou nos afundamos.

Emilce Cuda destacou o encontro do Papa Francisco com estudantes universitários de África, a 1 de novembro de 2022, em que lhe foi perguntado o que fazer com um continente que foi violentado, ao que ele respondeu que a organização vence o tempo, afirmação que leva a secretária da CAL a afirmar que a reforma da Igreja não se faz num tempo limitado, a Igreja sobrevive porque vence o tempo. Na ocasião, o Papa apelou aos universitários para que se organizassem para resistir, para serem criativos e criarem a sua própria doutrina, e não pegarem em doutrinas que foram construídas noutros contextos.

América Latina um continente organizado

A América Latina é um continente organizado, insistiu, citando como exemplo o Celam, que definiu como "uma novidade que dá conta do modo de organização que ultrapassou as fronteiras". Entre os frutos do CELAM, citou Aparecida, que considera ser a contribuição da Igreja latino-americana para a Igreja universal. Perante uma grande mudança de época, ela afirmou que as formas políticas, econômicas e bélicas já não servem, o que exige uma nova forma de organização, com organizações eclesiais, não só episcopais, como complemento destas, algo que emerge da América Latina.

A teóloga argentina recordou que as conferências episcopais trabalham dentro de uma nação, enquanto as comunidades eclesiais trabalham para além das fronteiras, lidando com problemas comuns a vários países: migração, tráfico de pessoas, narcotráfico, roubo de divisas, cuja solução requer unidade internacional. Neste contexto, afirmou que a Igreja vai mais além e propõe uma melhor política que atravessa fronteiras e aborda setores. Uma necessidade numa altura em que, na situação atual, a Igreja luta pela dignidade humana de uma forma diferente.

Organizar-se a partir do subsolo do planeta

Esta organização eclesial nascida na América Latina expandiu-se para outros continentes, redes eclesiais que, para além de serem comunitárias e organizadas a partir do subsolo do planeta, como afirma Francisco em Fratelli tutti, estão na América Latina há muito tempo, nas palavras de Cuda. Daí a sua insistência em que a salvação vem do subsolo do planeta, sendo o atual Magistério Pontifício uma forma de pôr em palavras o que foi gestado na realidade, nos seus documentos lemos a explicação de algo que já aconteceu.

É algo que o Papa levou para a Praedicate Evangelium, onde se debruça sobre a organização para levar a cabo a reforma da Cúria. "Nos seus princípios gerais não estão os conteúdos, mas o modo como temos de pregar, com palavras e gestos, tocando a carne sofredora e lavando os pés", sublinhou a secretária da CAL, que aí se define com o objetivo de cuidar da vida e do desenvolvimento das Igrejas particulares e o modo de colaboração com os dicastérios, a partir das redes e das conferências eclesiais, em que há uma grande riqueza.

Trata-se de cuidar

A Laudato Si no seu subtítulo fala do cuidado, que Emilce Cuda vê como outro exemplo de um caminho, "trata-se de cuidar". Em Fratelli tutti, a teóloga diz que este cuidado está nas mãos das redes eclesiais, insistindo na necessidade de se unirem e agirem de forma coordenada para cuidar da vida e do desenvolvimento, para que os nossos povos possam ter vida. A partir daí, apelou à Ameríndia para se unir e coordenar com outras redes.

"Cabe a nós sermos criativos no caminho", segundo Emilce Cuda, para quem a América Latina é criativa. Recordando as palavras do Papa Francisco numa conferência por ocasião do V Dia Mundial dos Pobres, em que apela a organizar a esperança, a teóloga assinalou que "as redes têm o objetivo de organizar a esperança, algo que é passado de ânimo leve, mas como cristãos temos de nos deter no conceito de esperança, que é mais do que algo ideológico, uma virtude teologal que faz de nós um exército sem armas cuja força vem desse dom sobrenatural que são as virtudes teologais".

Para Cuda, os sonhos da Querida Amazônia são outra forma de definir a esperança, e insistiu que as redes eclesiais da América Latina são esperança organizada. Por fim, recordou as palavras do Papa numa mensagem a um grupo de empresários, onde lhes fez ver a necessidade de ter em conta três elementos: a bússola, que é o Evangelho, que nos indica para onde ir, as ferramentas, que são as redes eclesiais, e a âncora, que é a esperança. Daí a importância de organizar a esperança de forma dinâmica, de pôr em prática a reforma da Igreja, e esta organização eclesial comunitária ajuda a concretizar uma reforma iniciada há 10 anos, que não é outra coisa senão a conversão, concluiu a teóloga.

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