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16/12/2019 Pe. Rodrigo Ferreira da Costa, SDN Edição 3917 Igreja Casa: Proximidade e Saída Missionária Igreja solidária e misericordiosa
F/ Periodistadigital
"Tomar a imagem da casa para pensar a mística pastoral de nossas comunidades eclesiais missionárias é mais do que propor um método pastoral, é, na verdade, uma espiritualidade que diz respeito ao modo da Igreja ser, a saber: uma Igreja próxima, uma Igreja solidária e misericordiosa."

A casa é o espaço do encontro e do convívio. É o lar onde encontramos espaço para a interioridade, para a intimidade, e em torno da qual o mundo se constrói. Não somos seres jogados no mundo, nascemos e fomos acolhidos num lar, numa casa de família, e vamos ao mundo a partir da casa, e o mundo é o mundo em torno à casa. Este ponto de referência não nos deixa nos perder na imensidão anônima do mundo.

Nossa primeira casa é o ventre de nossa mãe. Este “ventre que nos abriga é a primeira ‘escola’ de comunicação, feita de escuta e contato corporal, onde começamos a familiarizar-nos com o mundo exterior num ambiente protegido e ao som tranquilizador do pulsar do coração da mãe.” (Papa Francisco). A casa é esse “ventre” feito de pessoas diferentes, inter-relacionando-se. A casa é, portanto, imagem da proximidade, do convívio, do abraço, do encontro de “corpos” que se tocam e que exultam pela presença do outro (cf. Lc 1, 39-56)... Nessa trama das relações, damo-nos conta de que só vivemos e sobrevivemos se estivermos ligados, vinculados, conectados a outrem.

Tomar a imagem da casa para pensar a mística pastoral de nossas comunidades eclesiais missionárias é mais do que propor um método pastoral, é, na verdade, uma espiritualidade que diz respeito ao modo da Igreja ser, a saber: uma Igreja próxima, uma Igreja solidária e misericordiosa,  uma Igreja em saída.

 

O lugar da casa na atividade missionária de Jesus

O povo de Deus sempre se alegrou por ter um Deus próximo, que falava com Moisés, seu servo, face a face, como um homem fala com seu amigo (cf. Ex 33, 11). Um Deus que vê e ouve o grito dos oprimidos (cf. Ex 3,7-8), que caminha com seu povo, que o sustenta com o pão do céu e cumpre as suas promessas... Um Deus que mora no meio do povo (cf. Lv 26, 11).

O ambiente da casa exerce um papel central em sua atividade missionária de Jesus. Não se trata só da casa de tijolos nem só da família, mas, sobretudo, da comunidade. Durante os três anos em que andou pela Galileia, ele visitou as pessoas. Entrou na casa de Pedro (cf. Mt 8,14), de Mateus (cf. Mt 9,10), de Zaqueu (cf. Lc 19,5), entre outros. O povo procurava Jesus na sua casa (cf. Mt 9,28; Mc 1,33). Quando ia a Jerusalém, Jesus parava em Betânia, na casa de Marta, Maria e Lázaro (cf. Jo 11,3). Ao enviar os discípulos, deu- lhes a missão de entrar nas casas do povo e levar a paz (Mt 10,12-14).

Em Jesus Cristo, a Palavra eterna do Pai que estava voltada para Deus se fez carne e armou a sua tenda entre nós (cf. Jo 1, 1.14).  Ele é o Emanuel, Deus conosco. Por isso, Jesus sempre se fez próximo das pessoas: no diálogo com a mulher samaritana à beira do poço (Jo 4, 4-42); sentando-se à mesa com publicanos (Mt 9, 10-13), enchendo-se de compaixão pela multidão faminta e dispersa porque não tinha pastor (Mc 6, 34), no trato com seus discípulos chamando-os de amigos (Jo 15, 15); ensinando os discípulos a rezarem chamando Deus de Pai (Mt 5, 5-15). Nestes e em outros exemplos encontramos Jesus junto do povo, principalmente dos pobres e pecadores, não para julgá-los, mas para acolher, cuidar e apresentar-lhes o rosto misericordioso do Pai.

Desta forma, a comunidade de discípulos missionários precisa estar sensível às dores e angústias, alegrias e esperanças do povo. Pois “o Evangelho convida-nos sempre a abraçar o risco do encontro com o rosto do outro, com a sua presença física que interpela, com os seus sofrimentos e suas reivindicações, com a sua alegria contagiosa permanecendo lado a lado [...]. Na sua encarnação, o Filho de Deus convidou-nos à revolução da ternura” (EG n. 88). Daí a necessidade de uma Igreja que se faz próxima dos pobres e marginalizados, que ousa tocar as chagas do Senhor na miséria humana, na carne sofredora dos outros. Pois para Jesus, o amor salvífico de Deus sempre precede à obrigação moral e religiosa.

 

Igreja nas casas

A Igreja sempre teve consciência de ser uma comunidade de irmãos (as) reunidos (as) em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo para viver a caridade e proclamar o Reinado de Deus. Os primeiros seguidores de Jesus de Nazaré que se uniam aos apóstolos formavam a comunidade dos próximos, irmãos entre irmãos (cf. At 2, 42-47).

A proximidade da Igreja é, pois, essencial à evangelização. Sem experiência afetiva e efetiva de comunidade não há verdadeira vivência da fé cristã. Na comunidade cresce as relações interpessoais, a fé, o aprofundamento da Palavra de Deus, a participação na Eucaristia, a comunhão fraterna entre os irmãos, além de firmar as bases do compromisso com a justiça social e a defesa da vida (cf. DAp. n. 309).

No dia do nosso Batismo fomos acolhidos em nossa nova casa, nova família, a comunidade de fé. Nessa família cristã aprendemos a dar os nossos primeiros passos na fé. A Igreja é, pois, “colo de mãe” que acolhe, afaga, cuida... e se deixa interpelar pelos caídos à beira do caminho (cf. Lc 10, 25-37). “A Igreja é mãe, e nem você nem eu conhecemos uma mãe por correspondência. A mãe… dá carinho, toca, beija, ama. Quando a Igreja, ocupada com mil coisas, se descuida dessa proximidade e só se comunica com documentos, é como uma mãe que se comunica com seu filho por carta” (Papa Francisco).

Num contexto de cultura urbana no qual as pessoas vivem cada vez mais isoladas, “invisíveis” no meio da multidão, sem “rosto” e sem “nome”, faz-se necessário investir em pequenas comunidades eclesiais missionárias que olha no rosto, chama pelo nome, sente as dores e se alegra com as conquistas do seu povo. Comunidades que vivam a experiência do encontro, do abraço, do perdão e da festa e se une no compromisso missionário de ir ao encontro das “ovelhas perdidas”, fazendo-se próxima das periferias humanas e geográficas... “Trata-se de aprender a descobrir Jesus no rosto dos outros, na sua voz, nas suas reivindicações” (EG, n.91); pois se perdemos o contato terno com os rostos desfigurados de Cristo no mundo corremos o risco de cairmos numa evangelização doutrinária, ideológica, sem o perfume do Evangelho.

 

Igreja casa de portas abertas para acolher e sair ao encontro

 Quando lemos o livro dos Gênesis (18, 1-10) contemplamos a bela cena da visita de Deus a casa de Abraão. Deus apareceu a Abraão ao mesmo tempo em que os três viajantes. É a Deus que Abraão dizia: “Não passe, SENHOR, diante de teu servidor. Espera que eu receba os três viajantes”, porque os viajantes, cansados pelo calor e pela sede, passam antes do Eterno nosso Deus. A hospitalidade é, ao mesmo tempo, uma resposta ética ao outro e uma expressão da fé que acolhe a Deus que passa e se passa no rosto do outro.

A Igreja “casa” precisa ser uma comunidade hospitaleira sempre de portas abertas para acolher tantas pessoas com suas vidas cansadas e fadigosas, porque “a Igreja não é uma alfândega; é a casa paterna, onde há lugar para todos com a sua vida fadigosa” (EG, n. 47). Como o próprio Cristo que convida: “Vinde a mim, todos vós que estais cansados e carregados de fardo, e eu vos darei descanso” (Mt 11,28). Neste sentido, “a Igreja no Brasil, em sua ação evangelizadora, assume o compromisso de formar comunidades que vivam como Casa da Palavra, do Pão, da Caridade e da Ação Missionária. Nelas, as pessoas, movidas pelo Amor da Trindade Santa, vivenciem e testemunhem a comunhão fraterna, como família, entre amigos, irmãos na fé, companheiros de jornada nas estradas da vida, peregrinando rumo à Pátria Definitiva” (DGAE, 2019-2023, n. 129).

São muitos os desafios para sermos essa Igreja Casa, principalmente num contexto de cultura urbana, na qual predominam o individualismo, o indiferentismo, a violência e a exclusão. É preciso coragem e ousadia para fazer uma profunda conversão pastoral em nossas comunidades paroquiais, esta conversão implica na formação de pequenas comunidades que vivam a experiência da proximidade, do encontro, do cuidado e da responsabilidade com o outro. Comunidades que se nutrem da Palavra de Deus, se fortalecem no Pão, testemunhem a Caridade e saem apressadamente em missão.

 

* Pe. Rodrigo, SDN é licenciado em Filosofia, bacharel em Teologia, com especialização em formação para Seminários e Casa de Formação. Mora atualmente na paróquia São Bernardo, Belo Horizonte - MG.

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