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27/05/2020 Frt. Dione Afonso, SDN Edição 3924 Pandemia: na contramão da conversão ecológica
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"Necessitamos de uma mudança de vida, uma conversão. Conversão pessoal, comunitária e social que costura com todas as dimensões humanas: política, ambiental, ecológica, social, econômica, religiosa, educacional, cultural, espiritual."

 

Frt. Dione Afonso, SDN - dafonsohp@outlook.com

 No ano em que celebramos 5 anos de publicação de um dos textos mais importantes do século XXI, o mundo vive o que se pode chamar de contramão social e falta de sensibilidade humana para uma possível conversão socioecológica. A Carta Encíclica do Sumo Pontífice Francisco sobre o cuidado da Casa Comum Laudato Si’ é uma louvação pela ecologia e pelo planeta. Publicada em 24 de maio de 2015, o documento é um dos escritos mais importantes do pontificado atua.

No documento, o líder e pastor Francisco quer conduzir a humanidade num caminho de reflexão e revisão de vida. A carta visa chamar a atenção de toda a humanidade para a crise socioambiental que vivemos no planeta. É imprescindível de que precisamos mudar, mudar de mentalidade, de postura, de vida. E isso não é um caminho radical. É um caminho urgente: se não olharmos para nossas casas, para as nossas ruas e cidades com um olhar de posicionamento crítico e começar a entender que o planeta está morrendo, iremos perecer junto dele.

Francisco, na Carta condena o pecado do egoísmo que faz reverberar entre nós uma praga que se chama individualismo e um antropocentrismo que nos faz entender que cada um é o centro do universo e que tudo deverá girar em torno de si próprio. Tal mentalidade, segundo Francisco prejudica e fere a natureza e, se estamos, como ele afirma no decorrer de todo o documento de que “tudo está interligado”, estamos ferindo e matando a nós mesmos.

 

Uma crise humana que atinge todas as dimensões

A crise ecológica que vivemos tem sua raiz na sede de poder e de progresso do homem. “É justo que nos alegremos com esses progressos”, afirma Francisco, “e nos entusiasmemos à vista das amplas possibilidades que nos abrem a estas novidades incessantes” (nº. 102). “A tecnociência bem orientada pode produzir coisas realmente valiosas para melhorar a qualidade de vida” (nº. 103). De um lado, Francisco elogia e agradece pela criatividade tecnológica, pois, aliada à bondade e caridade humana, pode ajudar muitas vidas a se recuperarem.

No entanto, é perceptível que, com isso, “nunca a humanidade teve tanto poder sobre si mesma, e nada garante que o utilizará bem, sobretudo se se considera a maneira como o está fazendo” (nº. 104). Vivemos no momento atual uma pandemia provocada pelo contágio acelerado da COVID-19. Grandes momentos de tensão e de preocupação tem assolado países pelo mundo afora. Tal momento vemos o quanto que o poder aniquila o senso de humanidade entre nós. Isso só corrobora a fala de Francisco dita há cinco anos.

Necessitamos de uma mudança de vida, uma conversão. Conversão pessoal, comunitária e social que costura com todas as dimensões humanas: política, ambiental, ecológica, social, econômica, religiosa, educacional, cultural, espiritual. Uma abrangência que concretiza o fato de “tudo estar interligado”, como se fôssemos um. E, de fato, somos um! Se a vida do planeta corre perigo, todos nós corremos também.

Teólogos, cientistas, economistas, líderes e formadores de opinião do mundo todo tem se dedicado em fazer uma releitura da Laudato Si’ em seus artigos. No momento, os cabedais de que dispomos não se encaixam em tal formação, no entanto, ousamos afirmar que mais que uma releitura, é hora de verificar se as linhas de ação que tal Documento nos provocou foram, de fato, concretizadas. Estamos respeitando nossa Amazônia? Hoje nossos povos originários como os indígenas, ribeirinhos ainda sofrem atentados contra suas vidas? O aborto ainda é assunto de pauta sobre se deve ou não realizá-lo? Já nos conscientizamos a respeito do lixo de nossas casas? Francisco condena uma ideologia tecnocrática que coloca o desenvolvimento e a salvaguarda do dinheiro como prioridades. Para ele, fica claro que tal sistema é um sistema de morte que atinge diretamente a classe trabalhadora, pobre e indefesa do nosso país. E, não importa o quanto isso vai nos custar, “o interessante é extrair o máximo possível das coisas por imposição da mão humana, pois os recursos do planeta são infinitos, podemos espreme-lo até o limite e para além dele” (nº. 106). Esse sistema ainda prevalece entre nós?

Por fim, vivemos um momento que simplesmente fortalece a contramão de salvaguarda do planeta. Parece-nos que continuar salvando a economia do país é a saída mais acertada do que olhar para a natureza, olhar para as pessoas, olhar, sobretudo, para nossos idosos, grupos de risco, homens e mulheres mais vulneráveis. Se há cinco anos, tivéssemos entendido a Laudato Si’, hoje estaríamos mais conscientes diante da pandemia que estamos passando.

 

Um diálogo pelo Bem Comum

Como saída dessa roda que nos afunda a cada dia, Francisco, em outras palavras nos alerta para que possamos nos converter. Passar do “o que eu quero” para “o que o planeta precisa”. Passar do “bem-estar” para o “bem viver”, pois este nos coloca numa alteridade necessária. Um movimento que nos faz enxergar o outro e, enxergando o outro, juntos olhamos para o planeta, para a Casa Comum.

Segundo a Gaudium et Spes uma Constituição Pastoral pós Vaticano II, o Bem Comum “é o conjunto das condições da vida social que permitem, tanto os grupos como a cada membro, alcançar mais plena e facilmente a própria perfeição”. E, Francisco na Laudato Si’, diz que “o bem comum pressupõe o respeito pela pessoa humana enquanto tal, com direitos fundamentais e inalienáveis orientados para o seu desenvolvimento integral. O Bem Comum requer a paz social, isto é, a estabilidade e a segurança de certa ordem, que não se realiza sem uma atenção particular à justiça distributiva – e, nela, especialmente o Estado – tem obrigação de defender e promover o bem comum” (nº. 157).

Outra coisa que hoje é, de certa forma, um vírus é a proliferação de fake news que entram em nossos meios de comunicação ludibriando grande parte da população. O multiplicar, compartilhar notícias falsas dificulta o trabalho e a participação consciente da sociedade. É o que Francisco chama de “abuso de poder”, quando este confere à homem autoridade abusiva que massacra o pequeno. Quanto mais eu tenho, mais me sinto no direito de ter. Um paradigma pautado no bem-estar e não no bem viver e que não visa o bem comum.

Para terminar, vale ressaltar que hoje, o Brasil já atinge a marca do segundo lugar na lista dos países que apresentam o maior número de casos confirmados de coronavírus. Na noite do dia 22 de maio (sexta-feira), o país brasileiro ultrapassou a Rússia ao confirmar mais de mil casos em 24 horas por dois dias consecutivos. O país chegou a um total 330.890 diagnósticos da doença do novo coronavírus. Este número coloca o Brasil atrás apenas dos Estados Unidos, que possuem 1,59 milhão de casos. Em terceiro, fica agora a Rússia, com 326.448 casos confirmados.

O número de óbitos já ultrapassou a marca dos 24.000 e em 24h foram registradas mais de mil mortes pelo vírus. Se continuarmos ignorando os alertas que há cinco anos foram registrados na Laudato Si’, é provável que caminhos mais sombrios estejam por vir. Estamos celebrando a Semana Laudato Si em todo o país, e, é hora de olharmos com mais carinho e humanidade para as causas que nos ajudam a salvar vidas e salvar o planeta. Linhas de ação e um diálogo humanizado nos ajuda a olhar pro próximo.

A ordem ainda permanece a mesma: ficar em casa e se ser urgente sair, use álcool em gel e só saia de máscara. Ao voltar para casa não toque em ninguém e nem em nada antes de se higienizar. Lave bem lavada sua máscara e higienize seu celular, caso tenha saído com ele. Outra coisa, cuide do grupo de risco. Talvez não tenha idosos em sua casa, mas pode ter na sua rua, no seu vizinho. Essas pessoas precisam de nós. Partindo de pequenas ações assim, podemos atingir as ações maiores conscientizando nosso povo.

 

F/  Comfreak via Pixabay

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