Maria
Micheline, filha do Ralinho dos Correios, decidiu levar guaraná todos os dias para o lanche.
Os pais, a princípio, concordaram. Depois, quiseram mudar a coisa:
- Filha, guaraná todo dia faz mal, leva uma fruta, um suco...
E, devagarinho, diminuíram o guaraná.
Mas, a menininha, firme, “lutando por seus direitos”, saiu-se com esta:
- Ah, papai, deixa eu levar guaraná todo dia... Deixa, pai!
E, com ênfase, notando que já estava ganhando a causa:
- Até na reza da escola fala pra tomar guaraná... Até na reza!
- Que reza é esta? Os pais ficaram curiosos...
E Micheline, dona da situação - e de seu mundo de 5 anos - com as mãos juntas recita a tal reza:
- “Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós, pecadores, A GUARANÁ hora de nossa morte, amém!”
Micheline ganhou a causa: leva guaraná todos os dias...
* * *
O Gustavo, de 3 anos, filho do Antônio Augusto e da Jussara, viajava atento à estrada para Dores do Indaiá, para matar saudades da terrinha...
- Olha a vaquinha!
- Olha o rio!
- Que é aquilo, papai?
E, de repente, já bem de tardinha, olhou para o céu, maravilhou-se com o pôr de sol e falou, como se tivesse descoberto uma lei de Física:
- Gente, gente, que beleza! “Tá dinoitando! Tá dinoitando!”
* * *
Ana Carolina tem 6 anos. Vocabulário excelente, vivacidade extrema, brinca como se fosse adulta...
No consultório de mentirinha, claro, ela é a médica. Avô, avó, mãe, pai são os pacientes... Pra Laís, sobra o papel de gatinha, que é colocada no pet shop - debaixo da mesa, miando, miando...
Chegando para o trabalho, vovó reclama do atraso da médica. Ana Carolina acalma a todos:
- “Desculpem, peguei um engarrafamento no trânsito”...
E, foi atrás do avô que se cansou de esperar. Fez cara de brava e exigiu:
- Você vai ficar no Cantinho do Pensamento, para aprender a não fugir do consultório.
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Essa é da LAÍS, a gatinha da irmã... muito esperta para sua idade, três anos e meio, vai reparando o caminho para a escola: vovô e vovó são os condutores.
Observava tudo, pela janelinha do carro: carros, carros, prédios, árvores de todas as cores, a mesma paisagem de todo dia. Mesmo assim, Laís se encanta:
- Vovó, as árvores parecem brócolis gigantes...
De repente, ela vê uma árvore diferente, totalmente sem folhas...
- Vovó, vovó, olha uma árvore careca.
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Clara e Artur, meus netos, num domingo, não queriam ver o programa que os pais assistiam na TV.
- Passa, passa, passa...
A mãe, doida pra ter sossego, ia rodando os canais, e nada.
- Como é o programa, Clara?
- É um do Espírito Santo...
A mãe foi direto para a Canção Nova...
A menina dando birra:
- Não, não, não....
A mãe rodando os canais, rodando, rodando. De repente, Clarinha exultou:
- É esse!!! Para, põe mais alto, é esse!
A mãe caiu das nuvens: na tela, nada mais, nada menos, aparecia o rosto e o sorrisão do... SÍLVIO SANTOS
* * *
Netinho e Isabela e Fernanda e Marina e Lilise e Alice e Luísa e Rafael, alguns da turma de netos da casa, brincavam de esconde-esconde dentro de casa, em lugar apertado, cheio de móveis... Então, era fácil achar o esconderijo uns dos outros...
Isabela, muito sabida, pensou, pensou e subiu na minha cama, quase caindo para alcançar um crucifixo grande que eu mantinha no quarto.
- Que é isso, Belinha? Tá ficando doida? Vai quebrar meu crucifixo!!!
E ela, dona das filosofias infantis:
- Vovó, tô só virando ele pra parede...
- Pra quê, Belinha?
- Ele é Deus, vê tudo e tá fofocando... Fica contando pros meninos onde é o esconderijo de todo mundo. Assim, não tem graça...
- Desceu da cama e ainda desbafou:
- Fica aí, enredeiro!
E o esconde-esconde continuou:
* * *
Pedro Henrique tinha quatro anos e veio passear em Dores.
Ficou no alpendre, sozinho. A mãe ouviu conversas e estranhou, pensando que havia entrado alguma pessoa estranha...
- Pedro, quem está aí com você?
- Ninguém, uai!
- Com quem você está conversando?
E o menino, triunfante:
- Uai, EU COM EU.
* * *
Beto, sobrinho da Ornélia, fora visitar a tia, ou melhor, visitar as laranjas do quintal da tia...
Ficou um tempo, encheu uma sacola de laranjas e, ao se despedir, ouviu da tia o costumeiro uso das Gerais:
- Vai com Deus!
Beto quis ser gentil com a tia, tão boa, tão preocupada...
- Que isso, tia? Não precisa, é tão pertinho!
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Gabriel quis ajudar no banho do irmãozinho, Henrique.
A banheira em cima da cama, para evitar perigos...
De repente, o Gabriel tanto fez, que a banheira virou e o Rick pediu socorro:
- Mamãe, mamãe, o Gabi me derramou...
* * *
Clarissa tinha mania de espremer “cravos” – aqueles pontinhos amarelos no nariz das irmãs menores...
- Para com isso, Cissa, já falei que isso não é cravo...
Então depois de espalhar o sofrimento pela turminha toda, soltou a Luísa, que deu graças da Deus. Aí ela pegou o priminho Rafael e ele, prevendo o suplício, esperneava e implorava:
- Cacaca, não! Cacaca, não!
(O cravo da casa dele se chamava Tataca...)
* * *
Para arrematar a minha homenagem às crianças, enfeites do mundo, (re)conto a de meus sobrinhos Rodrigo e Quico.
Enquanto esperavam o almoço, conversavam, conversavam e não chegavam a um acordo.
Então, procuraram a roda dos adultos. Cada um trazia uma coisa escondida nas mãos. Fizeram suspense e falaram quase ao mesmo tempo:
- Gente, aposto que ninguém sabe!
Todos olharam para os dois chegantes, e eles:
- Fecha os olhos e só abre quando eu der a ordem:
Todos de olhos fechados:
- Pode abrir, pode abrir!
Cada um exibia um pedaço de mandioca - que surrupiaram na cozinha - e desafiaram a turma dos sabichões:
- Quem sabe quem pôs o pavio dentro da mandioca? Quem sabe?
Vinícius, o mais sabido da turma, explicou:
- Aposto que é minhoca... Elas é que sabem fazer esses buracos nas coisas.
Quico e Rodrigo riram do primo da cidade grande.
Vinícius não gostou e caprichou na resposta:
- A professora falou que a minhoca é útil, então é ajudante...
- Ajudante de quem? Vai ser bobo!
Aí, acabou com os dois primos:
- Ajudante de Deus!!!