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23/10/2019 Santini Edição 3917 Uma barca no Amazonas Editorial
F/ REPAM
"A convocação do Sínodo forneceu lenha para a fogueira ateada por grupos conservadores "


PEDRO conheceu Jesus de Nazaré ao lado de sua barca de pescador. Depois, seria promovido a pescador de homens. Ao longo dos séculos, a imagem da barca foi o símbolo da Igreja tendo o Papa como timoneiro. Estar com Pedro é uma exigência da unidade eclesial.
A história registra vários cismas, quando alguém decidiu abandonar a barca e separar-se de Pedro. Hoje, quando a Santa Sé ouve o clamor dos bispos e comunidades da Amazônia e acolhe em seu seio o Sínodo da Pan-Amazônia, ressurgem vozes dissonantes e acenam com a ameaça de uma nova quebra da comunhão.
Ora, ainda que o Reino de Deus não seja deste mundo (cf. Jo 18,36), o Evangelho de Jesus se dirige a pessoas e sociedades encarnadas, que passam fome e sede, sentem frio e calor, e foi no meio de gente assim que Jesus passou fazendo o bem. Quando a Igreja reconhece a importância (e a necessidade!) do Sínodo da Amazônia, ela revive os propósitos do Concílio, que afirmou: “As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos os que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo”. (Gaudium et Spes 1)
O Sínodo da Amazônia não brota de um grupo de acadêmicos dedicados à sociologia, mas do sofrimento e das lágrimas de comunidades que ali vivem seu calvário. Conforme o “Instrumentum Laboris” do Sínodo, “as comunidades consultadas salientaram também o vínculo entre a ameaça à vida biológica e à vida espiritual, ou seja, uma ameaça integral. [...] Por exemplo, a destruição e contaminação natural atingem a produção, o acesso e a qualidade dos alimentos. E, neste sentido, para cuidar responsavelmente da vida e do ‘bem viver’, é urgente enfrentar tais ameaças, agressões e indiferenças. O cuidado da vida se opõe à cultura do descarte, da mentira, da exploração e da opressão. Ao mesmo tempo, supõe a oposição a uma visão insaciável do crescimento ilimitado, da idolatria do dinheiro, a um mundo desvinculado (de suas raízes, de seu contorno), a uma cultura de morte”.
A convocação do Sínodo forneceu lenha para a fogueira ateada por grupos conservadores que rotulam o Papa Francisco de “comunista”, dada a sua insistência em aspectos sociais do Evangelho. Ao regressar de sua recente viagem à África, Francisco afirmou que reza para que não aconteça um cisma na Igreja, mas não tem medo disso.
É natural que Francisco incomode católicos acomodados em um estilo de vida satisfeito, mas indiferentes à dor do próximo, e se sintam interpelados diante da lembrança da situação dos migrantes, dos excluídos da sociedade e das vítimas do sistema, como no caso das populações amazônicas.
De 6 a 27 de outubro, Roma acolhe os Padres sinodais que refletirão, à luz do Evangelho, a situação extrema que assola a Pan-Amazônia. É visível o mal-estar reinante entre grupos empresariais e círculos do governo diante daquilo que lhes parece ser uma intromissão em assuntos “temporais”. Esta reação apenas vem confirmar o valor e a importância que ainda são atribuídos à Igreja e ao Papa, como as últimas instâncias de resistência à invasão do capital e da ganância. A matéria de capa desta edição, assinada por Victor Codina, SJ, ilustra de forma ampla e profunda a situação que estamos vivendo.
É nosso dever de fiéis sustentar com nossa oração os trabalhos do Sínodo, crendo firmemente que a assistência do Espírito Santo trará surpresas e novas esperanças, muito além do que podem supor os temores dos adversários e as esperanças de todos nós.
E isto é para começo de conversa...]


[ANTÔNIO CARLOS SANTINI

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