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“Não me envergonho do Evangelho” Mês da Bíblia 2025 – 1/3

Por Denilson Mariano

Na Igreja do Brasil, setembro - o mês da Bíblia - configura um tempo forte de evangelização. Por meio da Palavra voltamos às raízes de nossa fé cristã. Uma oportunidade de melhor conhecermos a Escritura Sagrada para que seja melhor vivida e praticada. Este ano, celebrando os 2025 anos da Encarnação de Jesus somos convidados a refletir sobre a Cartas aos Romanos na certeza de que “A esperança não decepciona” (Rm 5,5).

As cartas paulinas, em geral, têm um estilo pessoal, curto e direto, mas não é assim com a Carta aos Romanos. Esta foi escrita com a ajuda do secretário Tércio (Rm 16,22), é maior que o Evangelho de Marcos e traz temas mais doutrinários, que servem para qualquer comunidade. Mesmo assim, não é um texto fácil, porém de grande importância: Santo Agostinho muda de vida depois da leitura dessa carta; Lutero inicia a Reforma a partir de suas reflexões sobre esta carta.

A Carta aos Romanos tem sua autoria ainda discutida por certa parte dos estudiosos, que a apontam como sendo escrita por um discípulo de Paulo (entre 56 e 60 d.C.). Os que defendem a autoria direta de Paulo a datam entre 55 e 58 d.C. Importa ressaltar que o conteúdo da carta mantém os traços característicos do pensamento paulino, e por isso não precisamos nos desgastar com essa questão.

Uma comunidade pouco conhecida

Paulo não fundou nem conhecia a comunidade cristã de Roma, e pouco se sabe sobre o nascimento dessa comunidade. Talvez tenha sido formada por cristãos vindos da Palestina e da Síria, e logo se tornou conhecida no mundo (At 2,9-11). No ano 49, o imperador Cláudio expulsou de Roma os judeus e, possivelmente, os cristãos. O casal judeu-cristão Priscila e Áquila foi vítima dessa expulsão e foi para Corinto. Talvez tenha sido por meio deles (At 18,2) que chegou a Paulo a notícia de certo desentendimento entre os convertidos do judaísmo e os convertidos do paganismo. Paulo, que possivelmente estava em Corinto (inverno de 57/59), tinha o desejo de visitar a comunidade cristã de Roma e, de lá, ir à Espanha. A motivação da carta pode ter sido a de preparar sua chegada (Rm 15,14-29), e a carta teria sido levada pela diaconisa Febe (Rm 16,1).

O autor da Carta tem consciência de transmitir e defender o Evangelho, que é a força salvadora de Deus agindo no mundo por pura gratuidade. O Evangelho é a força do amor que envolve a todos: judeus e gregos; a Boa Nova de Deus para a salvação de todos (Rm 1,16-17). A Carta é dirigida aos que abraçaram a fé, em Roma, como “amados de Deus” e chamados a “ser santos” (Rm 1,7). Não se sabe exatamente como a Boa Nova chegou a Roma, grande centro administrativo, militar, político e religioso do mundo ocidental. Roma era a “Grande Cidade” que reinava sobre todos os reinos da terra (Ap 17,18). Contava, na época, com 1 milhão de habitantes, com numerosa colônia de judeus (cerca de 40 mil membros em 11 sinagogas). Aproximadamente 10 anos depois da ressurreição de Jesus, já havia em Roma uma comunidade de cristãos. Neste início, judeus e cristãos se confundiam naquela grande cidade.

Uma Igreja doméstica

Os cristãos se reuniam nas casas, como na de Áquila e Priscila (Rm 16,3-5), de Aristóbulo e Narciso (Rm 16,10-11), de Hermas e de Olímpas (Rm 16,14-15). Os trabalhos nas comunidades eram distribuídos entre homens e mulheres. A Carta fala da diaconisa Febe (Rm 16,1), da apóstola Júnia (Rm 16,6), de Maria (Rm 16,6), de Júlia e da irmã de Nereu (Rm 16,15). E não se sabe quando os convertidos do paganismo, os gentios, foram aceitos na comunidade ao lado dos judeus convertidos.

No entanto, há tensões entre os convertidos (judeus × gregos), quando alguns espalham fofocas a respeito de Paulo e de seu trabalho junto aos pagãos (Rm 16,17-18). Acusavam Paulo de revogar a Lei de Moisés e menosprezar a observância dos costumes judaicos. Isso será um dos motivos para a escrita desta Carta aos Romanos. Ela visava corrigir as falsas interpretações sobre os ensinamentos de Paulo. A comunidade de Roma enfrenta várias dificuldades em relação ao Império Romano: há perseguições à comunidade dos cristãos de Roma, como a de Nero (66–67 d.C.), e a perseguição de Domiciano (95–96 d.C.) fez surgir a reflexão que lemos no livro do Apocalipse.

Não se envergonhar do Evangelho

O conjunto da Carta aos Romanos não apresenta um tom polêmico nem apologético como outras cartas; nesta, reina um tom mais sereno e tranquilo, diferente da Carta aos Gálatas e da Segunda aos Coríntios. Ao afirmar que “não se envergonha do Evangelho”, o autor sente-se no dever de fazer o Evangelho chegar a todos. Pois não é uma simples mensagem, mas uma Palavra eficaz de salvação: um “poder” de Deus que salva. A palavra eficaz da Cruz substitui agora a outra palavra: a Lei (Torá), mas somente Deus salva, não o homem. Por meio de Cristo, esta salvação é oferecida a todo aquele que crê: judeu ou grego.

A Carta deixa transparecer a dificuldade de ser cristão naquela grande cidade. Além das perseguições, havia uma mentalidade perversa que tornava as pessoas cegas e surdas, vivendo de acordo com seus instintos egoístas, que sufocavam a verdade com a injustiça (Rm 1,18-20). Pessoas que desonravam seu próprio corpo e trocavam a verdade pela mentira (Rm 1,21-25); pessoas cheias de injustiça, perversidade, malícia, inveja, homicídios, fraudes, malvadezas, sem lealdade e prontas para difamar, caluniar, rebeldes, insensatas e sem coração (Rm 1,28-31). Isso, hoje, nos remete a uma realidade social chamada de “desvio cognitivo”.

Incapacidade de enxergar a realidade

Desvio cognitivo é quando a nossa mente interpreta ou entende algo de maneira errada ou distorcida, mesmo sem a gente perceber. Isso acontece por causa de nossas emoções, crenças pessoais, falta de informação ou até por influência do que vemos nas redes digitais. Por exemplo: imagina que alguém não respondeu à sua mensagem. Você pode pensar: "Ela não gosta mais de mim." Mas, na verdade, a pessoa só estava sem internet. Esse pensamento errado é um tipo de desvio cognitivo — você interpretou a situação de forma negativa, sem saber toda a verdade.

O desvio cognitivo pode apresentar várias consequências para a sociedade hoje: a) Fake news e desinformação: muitas pessoas acreditam em notícias falsas porque seus pensamentos já estão inclinados a confiar em certas ideias, sem checar os fatos. b) Preconceitos e julgamentos rápidos: julgamos pessoas ou grupos com base em ideias prontas, sem conhecê-los de verdade. c) Conflitos e polarização: desvios cognitivos alimentam brigas nas redes sociais e na vida real, porque as pessoas acham que estão sempre certas e não conseguem ouvir o outro lado.

Assim, o caminho apontado na Carta aos Romanos permanece atual para nós hoje: não há por que se envergonhar, pois o Evangelho é a força de Deus para a salvação de todos (Rm 1,16-17).

Para aprofundamento: Temos nos deixado guiar mais pelo Evangelho ou pelas redes digitais? Dê exemplos. Em que podemos melhorar?

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Carta aos Romanos – Mês da Bíblia 2025

 

 

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