Por Frei Betto
Desde a Grécia Antiga, Aristófanes já ironizava a má distribuição da riqueza em sua comédia “Pluto – A Riqueza”(388 a.C.). Nela, o deus da riqueza é cego, impedido de reconhecer os justos e, assim, favorece os espertos e inescrupulosos. A peça, repleta de críticas ácidas, mostra como o dinheiro move todas as relações humanas — do amor à guerra — e denuncia que, ao invés de premiar a virtude ou a moral, a riqueza acaba sendo controlada por quem sabe manipulá-la. Daí o substantivo “plutocracia”, o poder do dinheiro. Uma reflexão que, dois mil anos depois, continua muito atual, infelizmente.
A Oxfam divulgou relatório, em fins de junho, demonstrando o aprofundamento da desigualdade mundial. Em sete anos (2015-2022) a fortuna do 1% mais rico da população do planeta (77 milhões de pessoas) cresceu mais de US$ 33,9 trilhões. Com esse montante a pobreza no mundo poderia ser eliminada 22 vezes! Segundo o Banco Mundial, bastariam 1 trilhão e 515 bilhões de dólares.
Os países ricos assinam protocolos de erradicação da fome e combate à crise ambiental, mas nunca desembolsam o prometido. O dinheiro para salvar vidas é escasso. No entanto, bastou Trump ameaçar retirar o apoio financeiro à OTAN para a União Europeia prometer desembolsar 800 bilhões de euros para equipamentos bélicos. Para eliminar vidas o dinheiro é farto. Eis a lógica do capitalismo!
Quem são as 77 milhões de pessoas do seleto clube dos mais ricos do mundo? São todas aquelas que ganham, por ano, US$ 310 mil (= cerca de 1 milhão e 700 mil reais) ou mais. Essa elite multibilionária controla 45% da riqueza global, calculada em US$ 556 trilhões (dados de 2023). Isso significa que o 1% mais rico da população possui entre 250 e 278 trilhões de dólares.
Segundo o relatório da Oxfam, desde 2015 apenas 3 mil bilionários viram suas fortunas engordarem US$ 6,5 trilhões.
Um dos fatores que explicam tamanha desigualdade é a ausência de tributação progressiva. Os mais ricos deveriam pagar mais impostos, como Lula quer implantar no Brasil. O que vigora é o imposto regressivo: proporcionalmente os mais pobres pagam mais impostos que os mais ricos. E os ricos consideram as políticas sociais “gastos” e não investimentos. Alardeiam sempre que o governo gasta muito. No entanto, silenciam quando o Planalto destina recursos bilionários ao agronegócio ou isentam empresas de pagar impostos. No Brasil, esta isenção já atinge R$ 860 bilhões! A Oxfam esclarece que os bilionários pagam, em impostos, apenas 0,3% de sua fortuna.
Outra causa da desigualdade é a dívida pública. Os títulos da dívida pública são emitidos pelo governo para captar recursos junto a investidores. Na prática, quando o Estado emite um título, está pedindo dinheiro emprestado; em troca, promete devolver esse valor acrescido de juros em uma data futura. É uma forma de financiar o setor público.
A ciranda funciona assim: o governo vende títulos a investidores (bancos, fundos de investimentos, empresas ou pessoas físicas) e, em troca, recebe dinheiro imediatamente. No vencimento do título (ou de parcelas), o governo devolve o valor acrescido de juros. Portanto, quanto mais altos os juros (como agora), mais os especuladores do mercado financeiro embolsam dinheiro.
O capital privado, como bancos e grandes fundos, compra esses títulos como forma de investimento seguro e rentável. Assim, o Estado canaliza recursos públicos (via pagamento de juros) para remunerar o capital privado!
Isso produz vários efeitos: 1) Dependência do Estado em relação ao mercado financeiro; 2) Pressão por superávits primários (corte de investimentos sociais) para garantir o pagamento da dívida; 3) Prioridade ao pagamento de juros em detrimento de investimentos sociais.
Os impactos sociais da dívida pública são profundos e controversos, pois envolvem a forma como o Estado aloca seus recursos. Quando uma parcela significativa do orçamento público é destinada ao pagamento da dívida (juros e amortizações), isso pode restringir investimentos em áreas sociais fundamentais, como saúde, educação, moradia, segurança etc.
Para suportar tamanha dependência do público ao privado, apela-se ao “ajuste fiscal”. Isso significa manter a credibilidade do governo frente ao mercado e garantir o pagamento da dívida; promover cortes de gastos públicos (inclusive em serviços essenciais); reduzir ou eliminar os programas sociais; congelar salários de servidores públicos. Mas se o governo opta por aumentar os impostos dos mais ricos, a grita é geral!
Tudo isso afeta principalmente a população mais vulnerável, que depende dos serviços públicos, arca com a perda de direitos sociais e queda na qualidade de vida.
Na base da pirâmide social do planeta estão 3,7 bilhões de pessoas – quase metade da população mundial. Enquanto os mais ricos detêm 45% da riqueza global, os mais pobres apenas 2,4%.
A Oxfam constata que, entre 1995 e 2023, a riqueza acumulada em mãos privadas aumentou US$ 342 trilhões, ou seja, oito vezes mais que a riqueza dos governos, que cresceu apenas US$ 44 trilhões.
Qual a saída? Dar ouvidos ao alerta emitido por Aristófanes quatro séculos antes de Cristo: eleger governantes que representem os interesses da maioria da população, e não corruptos e oportunistas associados à plutocracia, que defendem as ambições da minoria rica e votam contra os direitos da maioria trabalhadora, como tantos deputados federais e senadores hoje no Congresso Nacional.
* Frei Betto é escritor, autor do romance sobre a ditadura e os indígenas “Tom vermelho do verde” (Rocco), entre outros livros. Livraria virtual: freibetto.org
Utilitaristas, descobriram que não precisa saber muita coisa; basta repetir ,repetir e repetir as mesmices que ouviram de um outro pregador. Crer e ser piedoso é necessário , mas também é necessário ser estudioso da fé, sobretudo da fé que veio com Jesus e com os apóstolos.
19 julho 2025[Frei Betto] A ciranda funciona assim: o governo vende títulos a investidores (bancos, fundos de investimentos, empresas ou pessoas físicas) e, em troca, recebe dinheiro imediatamente. No vencimento do título (ou de parcelas), o governo devolve o valor acrescido de juros. Portanto, quanto mais altos os juros (como agora), mais os especuladores do mercado financeiro embolsam dinheiro.
19 julho 2025Então algo inédito poderia acontecer. Todos os humanos, sentindo-se partes da natureza e seus guardiães, conviveriam em sinergia com o todo. O reino das necessidades teria ficado para trás e todos gozariam dos benefícios do reino da liberdade, agradecidos ao Criador, vivendo felizes e em paz perene, sob a luz e o calor benfazejos do sol.
19 julho 2025[Celso Carias] Há muito estudo sobre tal realidade que infelizmente não é decodificada para a grande massa trabalhadora. Aqui entra o que Han chama de “psicopolítica”, uma forma de converter mentes e corações para sua própria destruição. Quero apenas chamar atenção para um fator chave, que mesmo pessoas progressistas estão deixando de lado: dentro do capitalismo não há salvação.
19 julho 2025