F/ Sonia Gomes

 

O timoneiro, o orientador e a concretude da sinodalidade

Por Por Luis Miguel Modino

A Assembleia Sinodal terminou, mas não o Sínodo, que é um processo, nem a Sinodalidade, que é uma forma de ser Igreja. Quatro semanas podem ou não valer muito, mas estou convencido de que o tempo gasto durante a Segunda Sessão da Assembleia Sinodal do Sínodo sobre a Sinodalidade, que teve lugar na Aula Paulo VI de 2 a 27 de outubro de 2024, com dois dias de retiro prévio, dará frutos, trinta, sessenta ou cem por cento.

O timoneiro

Depois de tudo o que vi, resta-me aquilo a que chamaria o timoneiro, o orientador e a concretude. Os anos ajudam-nos a sedimentar, sobretudo quando vivemos e contemplamos a realidade do ponto de vista de Deus. O timoneiro de tudo o que a Igreja está a viver neste momento não é outro senão o Papa Francisco. Digo-o com base nas suas duas homilias e nos seus dois discursos, na abertura e no encerramento. Na missa da manhã de 2 de outubro, convidou-nos a procurar o caminho a seguir para chegar aonde Deus nos quer levar, tarefa nada fácil, dada a diversidade de proveniências e de ministérios eclesiais dos membros. Aqueles que sentem que perderam ou ganharam não compreendem o apelo de Francisco para que a Assembleia Sinodal seja um lugar de escuta em comunhão, não um parlamento.

A arrogância está presente quando, movidos pela autossuficiência, acreditamos que a nossa é a única forma de ser Igreja, com uma agenda a impor, e desprezamos aqueles que vemos como adversários; isso é superado pela fraternidade em comunhão, que leva a falar espontânea e abertamente, sem medo de rejeição, tornando-se pequenos e querendo estar entre os pequenos, nas periferias, ouvindo a voz do Espírito consolador, imagem do Deus misericordioso, que sabe e quer perdoar sempre e a todos.

O timoneiro procurou que todos remassem juntos e na mesma direção, apesar dos rebeldes que insistem em desafinar para que a sinfonia não soe bem. Na Igreja, ninguém é o que é sem o outro, incluindo o bispo de Roma, que deve também escutar para melhor orientar o leme de um barco em que ninguém falta, um barco sem muros, sem rigidez, que avançará na diversidade, sem condenações, através da experiência concreta que leva a descobrir o Espírito que sopra em todo o lado. Para isso, a Igreja não pode ficar sentada, muda, cega ou estática; temos de escutar o Senhor e sair de nós mesmos para caminhar juntos atrás d´Ele e com Ele.

O orientador

Considero Timothy Radcliffe como um dos grandes mentores da sinodalidade. O dominicano inglês é capaz de fazer uma leitura espiritual para ajudar a avançar nesta forma de ser Igreja a partir da escuta do Espírito Santo, que gera um sentimento de liberdade, que nos permite caminhar juntos e tomar decisões, pensar, falar e escutar sem medo. Só assim a Igreja Católica se pode renovar e responder a novas situações, assumindo “novas formas de ser Igreja que nos permitem estar em comunhão uns com os outros de uma forma mais profunda em Cristo e para Cristo”.

Antes de alguns o fazerem, Radcliffe já tinha avisado que “podemos ficar desiludidos com as decisões do Sínodo”, a quem deu a resposta: “pertençam à Igreja e digam Nós”. De fato, “não precisamos de ter medo do desacordo, porque nele atua o Espírito Santo”, Deus “atua suave e silenciosamente, mesmo quando as coisas parecem estar a correr mal”, como tem feito ao longo da história, “conduzindo-nos ao Reino por caminhos que só Deus conhece. A sua vontade para o nosso bem não pode ser contrariada”. De fato, “este é apenas um sínodo. Haverá outros. Não temos de fazer tudo, apenas tentar dar o próximo passo”.

Haverá sempre perguntas difíceis de responder, uma delas é: como pode a Igreja ser a comunidade dos batizados, todos iguais, e, no entanto, o Corpo de Cristo com diferentes papéis e hierarquias? Uma questão colocada pelo dominicano à Assembleia Sinodal. Para Radcliffe, “muitas pessoas querem que este Sínodo dê um Sim ou um Não imediato sobre várias questões”, daí a decepção de alguns. São aqueles que veem o Sínodo como um espaço “para negociar compromissos ou para bater nos adversários”. Perante isto, uma questão fundamental: “Teremos a coragem de confiar uns nos outros, apesar de alguns fracassos?”

A concretude

Finalmente, descobrir o que já temos de sinodalidade, que é algo que em maior ou menor grau existe, algo que o Arcebispo de Manaus, Cardeal Leonardo Steiner, fez. De fato, a sinodalidade tem a ver com diferentes realidades, entre elas o meio ambiente, já que na “Querida Amazónia, o Papa Francisco dá-nos uma hermenêutica da totalidade que é tremendamente sinodal”. Mas a sinodalidade também se manifesta na caminhada da Igreja na Amazônia. Ali, as mulheres, um dos grandes temas deste processo sinodal, “fizeram avançar as comunidades e hoje fazem avançar as nossas comunidades”.

Além disso, e aqui entra a questão das diaconisas, ele disse que “várias das nossas mulheres são verdadeiras diaconisas, sem terem recebido a imposição das mãos. E a estas diaconisas, gostaríamos de lhes chamar diaconisas, mas para não criar confusão com o ministério ordenado, ainda não encontramos uma palavra adequada”. A partir daí, sublinhou que “é admirável, admirável, quantas mulheres são responsáveis pela nossa Igreja, é admirável”, mulheres que “estão à frente das comunidades”, ao ponto de que “a nossa Igreja não seria a Igreja que é sem a presença das mulheres”.

São passos que estão a ser dados, talvez não ao ritmo que gostaríamos, mas ao ritmo de todos, um processo que nos deve levar a compreender que “o Sínodo para a Amazônia abriu a possibilidade de ter um Sínodo de Sinodalidade”, e que “a sinodalidade é um caminho sem retorno”, porque “estamos todos a entrar num movimento de ser Igreja, estamos a ser convidados a participar num modo de ser Igreja onde todos aqueles que receberam a graça do batismo e da confirmação, foram revestidos do Espírito Santo e de Jesus, se sentem responsáveis pela missão”.

 

 

Últimas notícias

Encontro da RUC: A política, modo de aproximar os estudantes universitários ao bem comum

Extras

A política é uma concretização do sonho social, do qual Francisco falou em Querida Amazônia. Este foi o tema de reflexão do II Encontro Sinodal de Reitores de Universidades para o Cuidado da Casa Comum da Rede de Universidades para o Cuidado da Casa Comum (RUC), que acontecerá de 20 a 24 de maio de 2025

26   maio   2025

Cardeal Steiner chama a “Uma mudança na economia que se tornou reguladora, dominadora da vida”

Extras

Provocações que são “um chamamento inicial para sinodalmente deixar ecoar o meio ambiente numa economia servidora, não exploradora”, com uma mudança cultural, que nos leve a descobrir que “somos todos devedores, mas também todos necessários uns aos outros”.

26   maio   2025

II Encontro da RUC encerra seus trabalhos com sinais de esperança em vista da COP 30

Opinião

“A caminho de uma Possível Remissão da Dívida”, o cardeal Leonardo Steiner destacou a importância da Laudato si´, que abordou a partir de quatro provocações: Hermenêutica da totalidade; pensar calculante e poético; o movimento da palavra economia;

26   maio   2025

Aos pés do Cristo Redentor, a RUC clama pelo “exercício da justiça ecológica, social e ambiental”

Especial

Aos pés do Cristo Redentor, cartão-postal do Rio de Janeiro, onde se reuniram de 20 a 24 de maio de 2025, na Pontifícia Universidade Católica, integrantes da Rede de Universidades para o Cuidado da Casa Comum (RUC) lançaram um chamado global por justiça climática.

26   maio   2025
Utilizamos cookies para melhor navegação. Ao utilizar este website, você concorda nossa Política de Cookies e pode alterar suas Preferência de Cookies. Consulte nossa Política de Privacidade.
Não aceito