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25/01/2022 Luis Miguel Modino - Regional Norte 1 Edição 3944 Alexandre Costa, no combate às mudanças climáticas superar “o negacionismo climático” Primeira parte da Entrevista com Alexandre Costa 1/2
F/ hindi.indiawaterportal
"Diante de tanta desinformação, muitas vezes auspiciada pelo poder econômico e político, a sociedade é chamada a tomar consciência da gravidade da situação. Alexandre Costa considera o Papa Francisco como um dos grandes aliados nesta luta em defesa do meio ambiente, da Casa Comum. "

Os desastres naturais que estão acontecendo no Brasil nas últimas semanas, eles têm a ver com as mudanças climáticas, segundo nos relata Alexandre Costa, professor da Universidade Estadual do Ceará. Doutor em Ciências Atmosféricas, ele trabalha há cerca de 20 anos com as questões climáticas.

Nesta entrevista, um dos autores principais do Primeiro Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas, que tem um projeto de divulgação científica voltado para a divulgação das ciências do clima, nos ajuda a entender quem está contribuindo para que tudo isso aconteça.

Diante de tanta desinformação, muitas vezes auspiciada pelo poder econômico e político, a sociedade é chamada a tomar consciência da gravidade da situação. Alexandre Costa considera o Papa Francisco como um dos grandes aliados nesta luta em defesa do meio ambiente, da Casa Comum. Uma luta que deve ser assumida no campo da política, onde chama a eleger àqueles que tem a defesa do meio ambiente como agenda prioritária.

O Brasil está vivenciando nas últimas semanas, mas é algo que acontece quase todos os anos, muitas enchentes em diferentes regiões do país, e ao mesmo tempo secas em outras regiões, cada vez mais prolongadas, e que cada vez tem consequências mais graves. Qual a leitura diante desses fenômenos que estão acontecendo cada vez com maior frequência no Brasil e no mundo?

Existe uma variabilidade natural do sistema climático. Isso é bem conhecido, a alternância de eventos, de “El Niño, la Niña”, modificam o comportamento do sistema meteorológico, mas é preciso a gente colocar de uma forma muito nítida para todo mundo, que o comportamento de uma atmosfera, hoje com 415 partes por milhão de CO2, é um comportamento muito diferente de uma atmosfera com 280 partes por milhão, como no período pré-industrial.

Basicamente, a atmosfera aquece devido a uma relação física bastante simples que existe entre temperatura e pressão de vapor de saturação do vapor d´água, ou seja, a quantidade de vapor d’água que existe no Planeta. Quando o Planeta aquece, a atmosfera se torna capaz de armazenar mais vapor d´água, e aí a gente passa a ter um binômio de eventos extremos associados com essa mudança de comportamento.

Se a atmosfera, ela requer uma maior quantidade de vapor d´água para saturar, ela vai extrair mais água da superfície, e aí nós temos maiores taxas de evaporação e evapotranspiração, termina o nível dos reservatórios hídricos baixando mais rapidamente, a umidade do solo baixando mais rapidamente. Você coloca um estresse maior sobre a vegetação, porque as taxas de transpiração aumentam, tanto vegetação natural quanto culturas agrícolas, e aí você vai tendo secas mais intensas, mais duradouras. A perda acelerada de umidade do solo e de ressecamento da vegetação facilita aumentos de calor severo e os incêndios florestais.

De outro lado, por ser agora um reservatório maior de vapor d´água, uma vez que esse vapor d´água se condense e comece a produzir nuvens, você tem matéria prima a mais para produzir chuvas muito intensas e muito concentradas, furacões mais intensos. Esse binômio de eventos extremos, de seca de um lado e do outro, chuvas muito intensas, tempestades severas, esses fenômenos vão se intensificando com uma causa comum, que é justamente o aquecimento global e o consequente aumento da quantidade de vapor d´água.

Há muitos anos a minha comunidade científica vem alertando, o aquecimento global não é simplesmente você subir a temperatura, isso está longe de ser a principal questão. A principal questão é o conjunto de alterações generalizadas do sistema climático, inclusive a mudanças das estatísticas de eventos extremos, que se tornam mais intensos e mais frequentes.

O senhor fala sobre uma proposta científica, sustentada em longos anos de estudo e em fatos aceitos por uma grande maioria da população, mas que cada vez encontra mais oposição em determinados grupos políticos e econômicos no Brasil. Como ajudar a tomar consciência dessas propostas científicas, mas que muitas vezes, motivados por interesses econômicos e políticos, esses grupos estão querendo combater?

O importante é a gente entender que o fenômeno do negacionismo, ele não é de agora. As pessoas se surpreenderam do negacionismo da pandemia, mas a gente que lida com a questão climática, já tem enfrentado a questão do negacionismo climático há muito tempo. Na realidade, as grandes petroquímicas, a indústria de combustíveis fósseis, em particular as petroquímicas dos Estados Unidos, com destaque para a Esso, mas o conjunto delas, representadas pelo Instituto Americano do Petróleo, já sabiam, pelo menos desde final da década de 70, que a continuidade do uso de combustíveis fósseis, iria produzir radicais, mudanças perigosas: a elevação da temperatura, a perda de massa nas regiões polares, a elevação do nível dos mares. Isso já era amplamente conhecido.

Em 1978, a Esso, ela mesma fez estudos sobre isso, que confirmava o que as ciências do clima começavam a apontar. Depois, a única coisa que eles fizeram foi financiar o negacionismo, recrutar pessoas do meio acadêmico, da empresa, da política. Tem um documento inclusive dos anos 90, da chamada Global Planet Coalition, que se tornou público e que diz muito claramente que eles só iriam conseguir a vitória se conseguissem fazer com que a população em geral passasse a perceber incertezas nas ciências do clima, quando políticos passassem a aderir à agenda deles, quando a cobertura de imprensa defendesse um equilíbrio entre a ciência e explicações alternativas, e quando os defensores do protocolo de Kyoto fossem vistos pela sociedade como pessoas fora da realidade, alarmistas, catastrofistas exagerados.

No caso do Brasil, isso foi adotado pela bancada do agronegócio, a gente tem picaretas, pilantras negacionistas, que vem do meio acadêmico e que são fortemente bancados pelo agronegócio. A tragédia, primeiro nos Estados Unidos com Trump, depois no Brasil com Bolsonaro, é que o negacionismo chegou ao poder político. Se as agendas já eram insuficientes, a chegada ao poder desses governantes negacionistas, compromete seriamente o tipo de mudança profunda e rápida que estamos precisando.

Fazer uma transição energética que nos livre dos combustíveis fosseis e zerar o desmatamento, e rever nossas práticas agropecuárias e seus efeitos. A próxima década ou duas, a gente precisa estar concluindo esse processo de transição profunda e a gente coloca a presença desses setores, dando espaço na mídia. Tem que se refletir sobre o encastelamento de parte da comunidade científica, e nesse aspecto a imprensa precisa ser uma grande e potente aliada, trazendo a questão climática para as primeiras páginas, e estar tudo dia, porque tudo dia tem tragédia.

A gente sabe que o melhor que a gente pode conseguir é segurar 1,5 graus e já estamos em 1,2, e isso significa que vamos ter que puxar o freio de mão e conquistar aliados, trazer isso para a agenda política. A gente espera que em 2022, além dos graves problemas que afligem o povo brasileiro a cada segundo, principalmente fome e desemprego, a gente consiga também pautar a questão climática, porque uma questão tem a ver com a outra e precisa tratar como um problema unificado.

Continua... O papel relevante do Papa Francisco

 

 

 

 

 

Foto Prensa Celam

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